EUGÊNIA DE VASCONCELLOS
( Portugal – Lisboa )
Eugénia de Vasconcellos nasceu em 1967, em Faro. Espera não morrer, jamais, ainda que as evidências deem a morte por inevitável. É poeta. E entre um poema e outro cabem as crónicas, o ensaio, os contos e o romance.
Se tivesse de escolher um poeta, hoje, escolhia três: Camões, Whitman, Herberto Helder. É a poesia quem abre a porta ao futuro. É por isso que a morte não lhe morde os calcanhares. Autora de O Quotidiano a Secar em Verso (poesia), Camas Politicamente Incorrectas da Sexualidade Contemporânea (ensaio), Do Branco ao Negro (conto). Há traduções de obras suas em catalão, alemão, sérvio e romeno.
Biografía: https://www.wook.pt/autor/eugenia-de-vasconcellos/36866
A POESIA É PARA COMER: iguarias para corpo e para o espírito. Seleção de poemas Ana Vidal; coordenação editorial Renata Lima. São Paulo: Rabel, 2011. 252 p. 23,5x31,5 cm. Capa dura. Impresso em papel couchê matte 170 g/m2.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Um só
Uma praia tranquila
uma maré de destroços
do naufrágio das bibliotecas
dá à coisa a calma do mundo e a fúria
dois para fazer o nome da alegria
a maré dos destroços são todas as letras:
palavras conchas palavras contas
palavras malões palavras vestidos
palavras peixes coloridos escamas de luz
enfiadas num colar
rente ao pescoço à beira da voz
algas versos de nós colhidas ali do sal da água
Uma bíblia flutua
calma e fúria são alegria no cântico das páginas
arrancadas de dentro onde não cabe a hipérbole dos cânticos
mal cosidas páginas a tempo da igreja
não haverá oração mais sagrada melhor alimento
tão mal cozido pão de páginas
cântico arrancado cru da hipérbole dos cânticos
mal cosido cântico no tempo boa a linha
para enfiar os destroços do naufrágio das bibliotecas
uma a uma conta amado concha na linha do cântico
uma a uma letra à beira da voz colares de algas
um a um de búzios de nós
peixes coloridos
uma a uma escama letra de luz
são teus amores memória
na escada do ouvido à beira da voz
até que o mel na ponta da língua
seja o corte na ponta da seta
surdos
morrem gamos
caiem flechas
Nenhum coração se rasga
na praia tranquila
que não seja de amor:
roubaste-me com só um dos teus olhares
*
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Página ampliada e republicada em setembro de 2022
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